Morrer para o ontém
Pensamos que o viver está sempre no presente e que o morrer é algo que nos aguarda num tempo distante.
Mas nunca indagamos se essa batalha da vida diária é de fato viver.
Queremos saber a verdade a respeito da reencarnação, desejamos provas da sobrevivência da alma, prestamos ouvidos às asserções dos clarividentes e às conclusões das pesquisas psíquicas, porém nunca perguntamos, nunca perguntamos como viver — viver com deleite, com encantamento, com a beleza, todos os dias.
Aceitamos a vida tal qual é, com toda a sua agonia e desespero, com ela nos acostumamos, e pensamos na morte como uma coisa que devemos diligentemente evitar.
Mas, a morte se assemelha extraordinariamente à vida, quando sabemos viver.
Não pode viver sem morrer.
Isso não é um paradoxo intelectual.
Para se viver completamente, totalmente, de modo que cada dia seja uma nova beleza, tem-se de morrer para todas as coisas de ontem, pois, de contrário, viveremos mecanicamente, e uma mente mecânica jamais saberá o que é o amor ou o que é a liberdade.
Em geral tememos a morte, porque não sabemos o que significa viver.
Não sabemos viver, e por isso não sabemos morrer.
Enquanto tivermos medo da vida, teremos medo da morte.
O homem que não teme a vida não teme a insegurança, porque compreende que, interiormente, psicologicamente, não existe segurança nenhuma.
Quando não há segurança, há um movimento infinito, e então a vida e a morte são uma só coisa.
O homem que vive sem conflito, que vive com a beleza e o amor, não teme a morte, porque amar é morrer.
Se morre para tudo o que conhece, inclusive sua família, sua memória, tudo o que sente, a morte é então uma purificação, um processo de rejuvenescimento; traz então a morte a inocência, e só os inocentes são apaixonados, e não aqueles que crêem e que desejam descobrir o que acontece após a morte.
Para descobrir o que realmente acontece quando se morre, tem de morrer. Isso não é ilusão. Tem de morrer, não fisicamente, mas psicologicamente, interiormente, morrer para as coisas que são caras para você e para as coisas que te amarguram.
Se morre para cada um dos seus prazeres, tanto os insignificantes como os mais importantes, sem nenhuma compulsão ou discussão, então saberá o que significa morrer.
Morrer é ter uma mente completamente vazia de si mesma, vazia de seus diários anseios, prazeres e agonias.
A morte é uma renovação, uma mutação, em que o pensamento não funciona, porque o pensamento é coisa velha.
Quando há a morte, há uma coisa totalmente nova. Estar livre do conhecimento é morrer; e, então, está vivendo
Jiddu Krishnamurti
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